sexta-feira, 21 de outubro de 2011

A SELVAGERIA


 As imagens do ditador Kaddafi, preso, ensangüentado, sendo praticamente linchado e depois morto com tiros na cabeça e no peito, humilhado e desumanizado (ou humanizado) são realmente chocantes e dão a medida clara de quem somos nós. Que a civilização, por mais que siga seu rumo em direção a algum tipo de compreensão da própria fragilidade e beleza, tem muito ainda a caminhar, muito ainda a evoluir. Andei assistindo à minissérie britânica “Dowton Abbey”, um novelão que é um primor de humor fino, crítica social e observação dos modos e costumes. Todo mundo, de criados a aristocratas, são elegantes, educados, finos e limpos. E nas entrelinhas ainda se pode ver a sujeira e a hipocrisia. Mas ainda assim, aquela limpeza mandava seus soldados cometerem as maiores carnificinas nas colônias inglesas espalhadas pelo mundo. O ser humano é digno de lástima, como disse Strindberg. Mas voltando a Kaddafi, uma das figuras mais desprezíveis de nossos tempos (mas não o único!) foi um assassino monstruoso que nunca hesitou um instante sequer em mandar suas tropas torturarem, assassinarem e exterminarem seus opositores. Tratou a sua própria gente como lixo descartável. A história recente é cheia desse tipo de selvageria, que no meu modo de ver, é tudo farinha do mesmo saco, desde Hitler e sua matança sádica e incompreensível: as bombas de Hiroshima e Nagasaki, o assassinato de JFK, o massacre de Ruanda, o 11 de setembro, o fim do ditador Sadhan Hussein, a execução do ditador comunista da Romênia e a jararaca da sua mulher, os assassinatos capitais determinados pelas ditaduras comunistas depois das revoluções (Russia, Cuba, Tchecoslováquia, China etc.), os extermínios da Iugoslávia, as torturas e assassinatos cometidos no Chile, Argentina e Brasil na época das ditaduras militares, a violência dos traficantes e milicianos espalhados pelas favelas brasileiras, a ação dos coronéis do Nordeste, deixando morrer à míngua a população miserável e vítima da seca, os prefeitos espalhados pelo Brasil que roubam o dinheiro destinado à saúde, educação, merendas escolares, o assassinato de Chico Mendes e outros líderes populares na Amazônia, etc.... Enfim, seria preciso um exercício infernal de crueldade para listar a marcha da civilização e suas atrocidades. Acontece que em nossos tempos tudo é filmado, registrado e escancarado, então que fica difícil escamotear a nossa selvageria por trás dos perfumes e da aparente civilidade. Somos uns monstros! Acredito que sim, nenhum homem é uma ilha, nenhum homem pode se isentar de algum tipo de responsabilidade, seja por omissão ou nas pequenas e selvagens ações que tomamos a cada dia, fazendo de conta que elas não interferem no universo. Hoje mesmo, conversando com uns amigos, felizes, divertidos, que brincam e vivem a vida com poesia e festa, perguntei-lhes sobre Kaddafi. Todos responderam: quem? E, pra mudar de assunto e tratar de algo mais leve, perguntei-lhes sobre as medalhas brasileiras no pan-americano. E, eles: quê? Rs. Só voltando ao ditador assassinado com requintes de selvageria descontrolada. Tenho vontade de rir quando ouço que a ONU pede investigação sobre as circunstâncias de sua morte. Claro, é preciso borrifar um pouco de perfume sobre o óbvio, porque mais importante que ser honesto, é parecer honesto. E o Kadaffi? Como culpar um povo tão humilhado, tão massacrado, tão roubado, tão ofendido? Melhor virar a página e esperar pela próxima selvageria exibida em vídeos amadores na internet ou no jornal da TV. E creiam, aquela que acontece no outro lado da rua não é muito diferente!

Nenhum comentário:

Postar um comentário